“Aumento de pena superlota presídios e inviabiliza penas alternativas, que mais recuperam quem comete crimes”, diz Zé Neto


Ascom

Após a Câmara dos Deputados aprovar o Projeto de Lei 3780/23 na última terça-feira (31/10), que não mexe nos crimes do colarinho branco, mas aumenta as penas para os crimes de furto, roubo, receptação de produtos roubados, latrocínio (roubo seguido de morte) e outros, dificultando a aplicação das penas alternativas (as que mais ressocializam os que cometem crimes), o deputado federal Zé Neto (PT-BA) esclareceu os motivos de não ter votado favorável ao Projeto. 

“Podemos até pensar em aumento de penas, mas observando algumas questões que foram deixadas de lado numa votação que foi encaminhada sem o debate adequado. Na vida real, as penitenciárias não estão recuperando os que cumprem pena dentro delas e as penas alternativas dão um melhor resultado de ressocialização. Temos que ter cuidado como as coisas são colocadas para a sociedade. Por exemplo, com base nos dados apresentados pelo IPEA, 75% das pessoas que cometeram algum crime mais de uma vez foram condenadas a ficar nos presídios, e apenas 8,9% a penas alternativas, ou seja, cumpriram com punições fora do presídio, principalmente sociais, sem a privação total da liberdade. E o que mais chama atenção é que enquanto 89,3% dos condenados a penas privativas de liberdade retornaram a cometer crimes, apenas 6,6% dos que cumpriram penas alternativas voltaram a cometer crimes”. 

Penas alternativas eram aplicadas a quem cometia crime e tinha até 4 anos de pena. “Agora, como a maioria das penas que foram ampliadas com a aprovação do projeto alcançaram 4 anos ou mais, muitas das penas alternativas não poderão ser aplicadas e essas pessoas ficarão presas em presídios que não conseguem bons resultados com a ressocialização dos acusados”, explica Zé Neto.

É reconhecido pelo sistema judiciário que penas alternativas, sem que a pessoa que cometeu o crime fique nos presídios, mas cumpra punições sociais (cabíveis, segundo o Art. 44 do Código Penal, quando não houver violência ou ameaça; não for maior do que 4 anos ou para crimes culposos independente da pena; o réu não for reincidente em crime doloso; e o réu não tiver mais antecedentes), são mais eficientes e causam menos chances de que a pessoa volte a cometer crimes. 

Como continua o deputado, “o que é necessário nesse momento é fazer debates mais claros e precisamos é de uma justiça mais eficiente, com mais rigorosidade no cumprimento das leis que já existem. As penas alternativas ajudam a construir uma justiça com menos processos e com mais condição de recuperar aqueles que cometeram algum crime. E é bom que não se confunda rigorosidade da pena com ampliação de penalidade, que pode sobrecarregar, mais ainda, o sistema penitenciário que, infelizmente, sofre com uma grande dificuldade do ponto de vista da recuperação daqueles que por ali passam”. 

Conforme exemplifica o deputado, “um jovem que roubou uma chave de fendas, se for para o presídio, volta e tem muito mais possibilidades de voltar roubando um carro do que se ele for para uma pena alternativa, até porque estas pessoas aprendem, lá dentro, muitos outros crimes mais graves, porque as organizações criminosas atuam dentro da cadeia e, na grande maioria das vezes, conseguem cooptar pessoas que entram nas prisões por crimes de baixo potencial ofensivo, como pequenos furtos”.

A população prisional no Brasil bateu novo recorde e chegou a 832.295 pessoas no fim do ano passado. O número representa um aumento de 257% desde 2000. A maior parte dos presos é negra (68,2%) e tem de 18 a 29 anos (43,1%). Os dados foram publicados no 17° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, de julho de 2023. 

A pena geral de furto passa de reclusão de 1 a 4 anos para 2 a 6 anos, aumentando-se da metade se o crime é praticado durante a noite. A proposta será enviada ao Senado e ainda poderá voltar para Câmara, caso passe por alguma alteração.

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